DOMINGUES, José Bento. Filho de João Manuel Domingues e de Maria Rodrigues. Nasceu em 1878. // Suponho que foi emigrante no Brasil. // Casou com Ana Maria, filha de Manuel José Rodrigues e de Ana Rosa Esteves (*). // Em Dezembro de 1918 esteve bastante doente, provavelmente com a pneumónica. // Comprou a Quinta da Orada, sita na freguesia da Vila de Melgaço, aí criou os filhos, e aí morreu a 19/3/1930. No Notícias de Melgaço n.º 55, de 23/3/1930, pode-se ler: {«após horrível e prolongado sofrimento, morreu na sua casa da Orada, no dia 19, pelas 17 horas, o nosso íntimo e particular amigo, José Bento Domingues. À hora em que, trémulo e hesitante, procuro a caneta para bosquejar estas linhas, como preito e homenagem à virtude, à Honra, à Honestidade, lidimamente representadas por aquele que, entre lágrimas escaldantes, entre suspiros profundos, pétalas odoríferas, da mais virente «gerbe» acaba de baixar à terra gélida e inóspita da campa, à hora em que tantos corações se confrangem ao peso acabrunhador da mais cruciante dor, chorando um pai extremoso, adorado, pranteando um irmão querido e inolvidável, lamentando um esposo fiel e ternamente amado; nesta hora verdadeiramente caótica e tétrica para tantos corações vertendo sangue, - indubitavelmente, já uma lápide fria escondeu, para sempre, aos olhos de amigos devotados e sinceros, aos corações de filhos extremosos e queridos, o protótipo da virtude, da honra e da honestidade, o mais lídimo representante do amor filial, da fidelidade conjugal, o espécimen mais brilhante do cidadão virtuoso, do carácter mais fulgurante e austero. Lá no remanso bucólico do cemitério, de paisagem viva, engrinaldado de aspectos encantadores, no silêncio místico da campa, passa pela nossa mente, em delicioso «ecram» o rosário interminável de virtudes, que fulguraram intensamente naquele que encarnou, em vida, os deveres mais restritos do seu estado, ensinando-nos a ser o mais respeitoso dos filhos, o mais amoroso dos esposos, o mais afectuoso dos pais e o mais completo cristão. Nesta vaga de sensualismos estólidos, que procuram prostituir os mais nobres sentimentos e as mais belas aspirações do coração humano, nesta hora de malabarismos estúpidos que pretendem reduzir a Humanidade ao estado mais selvagem, semi-animal, neste momento de vaidades balofas, de heroísmos enfatuados, mas absolutamente ocos – é-nos imensamente grato curvar-nos, reverentes e respeitosamente, perante a carcaça humana, que serviu de invólucro a uma grande alma exornada das mais belas virtudes cívicas e cristãs, convidando-nos carinhosamente a enveredar pela senda luminosa que constituiu o apanágio daquele que até às borlas do túmulo pode ser tomado como o modelo do cidadão perfeito, do cristão completo. Era melgacense o Sr. José Bento Domingues, e ser melgacense é ter uma alma grande como o colosso das suas montanhas, de vistas largas como a amplidão dos seus panoramas, de profundezas penetrantes como a profundidade dos seus vales, de carácter puro e branco como a neve das suas serranias, de virtudes saudáveis como a frescura das suas brisas. Como a sociedade portuguesa seria guindada aos pâramos de uma glória eterna, servindo de modelo às nações estrangeiras, como Portugal figuraria no concerto das Grandes Potências, se todos os seus filhos foram do fino quilate daquele que acaba de descer ao túmulo! Oxalá a sua memória indelevelmente impressa na nossa alma sirva de eficaz incentivo para a virtude a todo o melgacense descendente dessa vetusta e veneranda plêiade de homens da nossa nacionalidade e do nosso concelho, cuja história se lê nas rugas das encanecidas feições desse povo melgacense, que foi cristão antes de ser português. É como pai, especialmente, que ele brilhou aos olhos dos seus conterrâneos, espelho límpido e claro em que reflectiam os mais nobres sacrifícios para garantir aos seus filhos um futuro florido enaltecendo ao mesmo tempo a sua família e a sua pátria. Pode-se nominar, sem laivos de lisonja, um benemérito da Pátria: entregou-lhe, desinteressadamente, cinco filhos que, patrioticamente, estão combatendo a maior e a mais grave doença de que enferma a sociedade portuguesa – o analfabetismo. Que modelo frisante para tantos pais que, vítimas do mais vil interesse, energúmenos criminosos, peiam os voos de seus filhos, ora privando-os dos recursos indispensáveis, ora abandonando-os à mercê dos seus caprichos e das suas paixões desenfreadas, incipientes! À memória de um amigo sincero e leal, para quem o céu brilha no seu divino esplendor, a minha gratidão devia estas palavras simples, mas que traduzem a veneração, respeito e admiração que era tido aquele que hoje dolorosamente pranteio. À sua esposa desolada, solitária neste báratro insondável de misérias e tristezas, a seu irmão inconsolável, padre Manuel José Domingues, aspirante de Finanças, a seus filhos Abílio e Maria de Jesus Domingues, professores em Chaviães, e Duartina Rosa Domingues, professora de Castro Laboreiro, autênticas glórias do professorado melgacense, aos senhores António e Rosalina Domingues, distintos alunos, aquele da E.N. e esta do liceu de Braga, ao mesmo tempo que, profundamente contristados, lhe enviamos o nosso cartão de sentidos pêsames e sinceras condolências, - recordamos-lhe como lenitivo, como bálsamo para as suas dores atrozes aquela frase de um cavaleiro medieval, gravada nas catacumbas de São Domingos, da Via Ápia, em Roma: «a morte para quem morre cristãmente é a vida!» C.A. Fernandes Miranda.»} Nota da redacção: «de quanto era amado é uma prova irrefragável o seu funeral realizado na quinta-feira, pelas 5 horas da tarde, concorridíssimo por numerosos amigos do finado, que vieram prestar-lhe a última homenagem, associando-se a Confraria das Almas desta Vila, com a sua bandeira, e o corpo activo dos BVM. Viam-se olhos marejados de lágrimas, ouviam-se suspiros plangentes, que davam ao préstito um tom verdadeiramente triste, mostrando bem o profundo pesar que dominava aquelas almas gratas e sinceras. Foram organizados diferentes turnos… R.I.P. = Requiescat in pace = descansa em paz.» // A sua esposa faleceu a 14/7/1954, com 78 anos de idade. /// (*) Ana Rosa Esteves morreu na Quinta da Orada, SMP, a 12/2/1948, com 95 anos de idade (NM 849, de 17/2/1948).