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CASTRO, Vitoriano da Glória (Dr.) Filho de Lourenço José Ribeiro Codesso de Figueiredo e Castro e de Maria Joaquina Mendes. Neto paterno de Jerónimo José Codesso Soares de Figueiredo e Costa e de Margarida Clementina de Lima Azevedo de Sousa e Castro (ele da Casa da Portela de Paderne e ela da Casa da Cordeira, Rouças); neto materno de Ana Luísa Mendes, natural de Cevide, Cristóval. Nasceu na Portela de Paderne a 27/8/1860 e foi batizado na igreja a 6 de Setembro desse mesmo ano. // Fez exame da 4.ª classe em 1872, depois foi para o Liceu de Viana do Castelo. Ingressou em 1890 na Universidade de Coimbra onde, em Julho de 1895, se formou em Medicina. Fixou a sua residência em Alvaredo antes de 1904 pelo facto de a esposa ter herdado a Quinta da Carvalheira. Para iluminar a casa comprou a João Batista dos Reis, famoso latoeiro, o gasómetro a carbureto “Sem Rival”, inventado pelo dito João. // Era solteiro, estudante, morava no lugar da Portela de Paderne, quando casou na igreja de Penso a 21/9/1891 com Joaquina da Boa Memória da Rocha Queirós, de dezassete anos de idade, solteira, proprietária, natural de Penso, residente no lugar de Bairro Grande, filha de Francisco José da Rocha, proprietário, natural da vila de Monção, e de Maria da Conceição Queirós, proprietária, natural de Penso, Melgaço, comerciantes na Vila de Monção e em Penso. A mãe da noiva, já viúva, deu consentimento à filha para ela se poder casar, em virtude de ser menor. Testemunhas presentes: o padre Manuel José Domingues e António Manuel da Rocha, casado, caixeiro. // Em Outubro de 1897 ainda morava em Penso. // Pertenceu ao Partido Progressista no regime monárquico. Depois de 1910 aderiu à República, mas, aborrecido com esta, em 1916 já se dizia simpatizante da monarquia. // Logo que terminou o curso abriu consultório em Melgaço, na «Farmácia Nova», de Domingos Ferreira de Araújo, sendo nomeado pouco depois médico municipal, tendo a Câmara criado o 3.º partido médico. // É uma das figuras mais carismáticas do concelho. Tudo lhe acontecia! // Outro caso menos agradável para ele foi quando a Câmara Municipal abriu concurso para um médico do 2.º partido, oferecendo 400$00/ano. O Dr. Vitoriano era detentor do 1.º partido e recebia 300$00. Candidatou-se; os outros candidatos eram o Dr. Manuel Pinto Magalhães e Dr. Joaquim Pereira. Foi escolhido o Dr. Magalhães. Uma injustiça, segundo a opinião dos colaboradores do “Correio de Melgaço”. Vingança! – acusavam os seus correligionários. O lugar já estava destinado ao Dr. Magalhães, segundo os do Correio de Melgaço: «O que revolta e indigna é que o Dr. Vitoriano, credor de todas as deferências e com uma larga folha de serviços prestados durante vinte anos, fique a perceber menos 100$00/ano! Isso não pode ser! Contra isso protestamos ardentemente e gritaremos sempre: abaixo a iniquidade!». «Ó céus! – porque não baixais à terra num momento dado e por intermédio de um planeta limpais dela esses homens, elevando-os para essas regiões onde não mais fossem vistos do povo?». Os do “Jornal de Melgaço”, do partido político oposto, aplaudiam. Os vereadores argumentavam: «para ele concorrer teria que se demitir de médico municipal.» Logo contra argumentaram os do Correio de Melgaço: «onde está a lei que manda que o médico se demita do lugar que ocupa para concorrer a outro qualquer lugar, quer fora quer dentro do concelho?!» Vendo bem as coisas, de facto existia alguma animosidade, tendo em conta que ele era o subdelegado de saúde – não devia ganhar menos do que o seu colega. Também o acusaram, aquando da epidemia da febre tifoide em Castro Laboreiro, iniciada em Agosto de 1913, de não ir lá com regularidade, e até de se fazer passar por doente para não ir. Foi também publicado, no “Aurora do Lima”, um desmentido acerca de um suposto conflito entre ele e o pessoal da Cruz Vermelha destacado em Castro. Mas nem tudo era negativo. O Dr. Augusto César Esteves, na altura notário e advogado em Monção, num agradecimento por morte de seu pai, ocorrida em Setembro, escreveu a 3/11/1914: «… Aproveito também a ocasião para novamente patentear aos Ex.mos Dr.s Vitoriano Ribeiro de Figueiredo e Castro e Bernardo Salgueiro e Cunha, distintos facultativos, os sentimentos da minha eterna gratidão pela forma carinhosa e desvelada como trataram, durante a doença, meu saudoso pai, e pelos esforços que envidaram para debelar o mal que deste mundo dos vivos fez riscar mais um nome». Estavam representados três partidos nessa lista: Democrático (Afonso Costa), Evolucionista (António José de Almeida) e Católico (não republicanos): clero, nobreza e povo. Faltava a União Republicana (de Manuel Brito Camacho), por não ter expressão no concelho de Melgaço. À cabeça da lista estavam o padre Francisco Leandro Álvares de Magalhães, reitor de Alvaredo, e o advogado, Dr. António Augusto Durães. A lista contrária era chefiada pelo capitalista João Pires Teixeira. Por ironia do destino, e devido à agitação que pairava na capital, essas eleições foram adiadas sine die… // O Governador Civil, a 19/3/1918, visitou o concelho. Foi acompanhado pelo Dr. Vitoriano, Dr. Antonio Durães, e pelos partidários deste: Luís Vicente Rodrigues, José Barbosa Martins, padre Francisco Leandro e António Xavier de Castro, irmão do médico. Os seus adversários não lhe davam tréguas. Na Vila de Melgaço encontrava-se na altura um grupo de oito elementos da Cruz Vermelha, não havendo, entre eles, nenhum médico; no entanto fizeram o que estava ao seu alcance, dando luta sem tréguas à maldita epidemia. A maldita epidemia, talvez devido à guerra, atingiu forte o concelho de Melgaço – dias houve que muitos mortos iam para o cemitério embrulhados em lençóis, pois já não chegavam as urnas! Mesmo com a ajuda da Cruz Vermelha o Dr. Vitoriano não tinha mãos a medir; a sua força, a sua resistência, estavam a ressentir-se de tanto trabalho e sobretudo de tanto sofrimento. Criticar é fácil, mas é necessário estar no terreno, ver morrer crianças e adultos nos braços, sem nada poder remediar, pois os medicamentos também escasseavam. Por incrível que pareça, até o Dr. Manuel Pinto Magalhães, que exercia a sua atividade de médico em Melgaço, faleceu, devido à terrível febre, em 1918! Contudo, houve casos de sucesso, por exemplo a família de José Augusto Domingues “Cabanal”. // Uma carta de Penso, escrita por um tal “João do Cabo” e publicada no Jornal de Melgaço n.º 1229, de 6/12/1918, é aviltante! O ódio, um ódio cego e bruto, tenta perfurar, destruir, a imagem de um homem, que era – apenas – um ser humano como outro qualquer. // Ter receio da morte é próprio do ser inteligente, não é sinónimo de cobardia. O médico arrisca a vida, mas não cegamente. Quando há uma epidemia, sem os meios adequados para a combater, não há médicos que nos valham. Os medicamentos, as condições higiénicas, etc., são fundamentais para debelar a doença. Em uma terra do fim do mundo, sem transportes, sem estradas para as diversas freguesias, isoladas pela neve e pelo frio, como Castro Laboreiro, que havia de fazer o médico? O Dr. Vitoriano viu morrer o seu colega, Dr. Magalhães, a 19/10/1918, atacado pela febre pneumómica; era jovem, e viera para Melgaço havia pouco mais de um ano. Era generoso, entrava em todas as casas onde havia doentes com a epidemia, não se acautelou, e assim terminaram os seus dias numa cama do hospital, vítima da doença que tentara combater. O seu corpo foi levado para Felgueiras, em cujo cemitério jaz, em jazigo de família. Para o substituir veio o Dr. Manuel Dias Moreira, que continuou a luta contra essa febre maldita. O Dr. Vitoriano foi uma espécie de bode expiatório para todos os males que surgiram no concelho nessa época – os colaboradores do Jornal de Melgaço até o acusaram, a ele e ao irmão António Xavier, a quem deram a alcunha de “Furrica”, de «amancebias e escândalos públicos!» E puseram-no a ridículo, no dito jornal, quando publicaram a quadra, inspirada, segundo eles, num conselho do Xavier ao irmão: «Mano, querido mano,/escuta o que eu te digo:/mano, vai para um convento/não esperes pior castigo.» // Em sessão da Câmara Municipal de Melgaço de 6/3/1919 leu-se um seu requerimento, o qual teve a seguinte resposta: «sobre o requerimento apresentado pelo senhor Dr. Vitoriano da Glória Ribeiro de Figueiredo e Castro, concorrente ao 1.º lugar do 1.º partido deste município, foi deliberado, por proposta do vogal Nóvoas, ficar para se resolver na próxima sessão.» // Por ter atingido o limite de idade foi aposentado em 1930. Era médico municipal e subinspetor de saúde. Pelo Presidente da República foi-lhe concedido o grau de oficial da Ordem de Benemerência, que recebeu das mãos do Governador do distrito, José Ornelas Monteiro, a 10/10/1948. // Morreu na sua casa da Carvalheira a 6/8/1951. // No livro “Padre Júlio Vaz apresenta Mário”, nas páginas 93-94, lê-se: «… abnegado, prestigioso e sempre lembrado médico que fez do seu munus um verdadeiro sacerdócio.» E a seguir: «Fosse onde fosse, fizesse o tempo que fizesse, nunca ninguém, rico ou pobre, remediado ou não, adoeceu que não tivesse à cabeceira a assistência pronta do Dr. Vitoriano. E caso notável: desapegado como era dos bens deste mundo, mormente dos necessitados, jamais recebeu pelos seus serviços clínicos tanto como um ceitil cortado ao meio.» // Ainda em nossos dias há quem se lembre dele, sobretudo quando se deslocava na sua charrete, puxada por um garboso cavalo. Certo dia aconteceu-lhe mais um percalço. // Apesar de ter sido um homem generoso e uma figura grandiosa, como homem político arranjou alguns inimigos! // Com geração. // Nota: antes de ser perfilhado, era conhecido por Vitoriano Augusto Ribeiro; no assento de casamento ainda surge como filho natural de Maria Joaquina Mendes, solteira.