Carta sobre as coisas que lhes sucederam depois que a nau partiu de Maluco, como tornaram a descarregar a nau e a "dobamos" muito bem com boa ajuda do rei de Tidori, fazendo-lhe muita honra, e a tornaram a carregar, partindo aos seis do mês de Abril de 1522, e fizeram o seu caminho para irem demandar terra firme, onde o senhor Andres Niño fez as caravelas que estão no mar de Sul [?]: Desta terra firme às ilhas de Maluco não há mais que duas mil léguas. Desde aquela data até ao fim de Agosto, sempre andámos trabalhando pelo mar, esforçando-nos por tomar terra firme. Por haver sempre ventos contrários desviaram 42 graus e meio da parte do Norte, onde sofreram grandes tormentas de mar e muito frio. Não tendo que comer nem roupa que vestir, adoeciam e morriam sem se poder ajudar, porque havia já quinze meses que só comiam arroz, pelo que determinaram arribar a caminho de Maluco, o qual estava a mais de mil e trezentas léguas. A quinhentas léguas de Maluco tínhamos descoberto catorze ilhas que desta via fomos demandar, e estão entre 20 e 10 graus da parte do Norte. Na Ilha de Mao, a 20 graus, foram quatro homens dos mais sãos, e ficaram três, esta com pouca gente, enquanto as outras tinham muita gente da côr dos das Índias. Partiram para Maluco mas antes de lá chegarem morreram trinta e sete homens, não ficando na nau mais de seis que pudessem trabalhar "os quais deram a vida aos outros", e no dia em que descobriram a terra dos reis de Maluco, vimos uma barqueta e nos disseram que os portugueses tinham chegado com sete velas à ilha de Ternate e que estavam a fazer uma fortaleza. Quando ouvimos estas novas, mandámos um homem dos nossos ao capitão mor, o qual se chamava António de Brito, com uma carta pedindo que lhe mandasse dar alguma gente que os ajudasse a levar a nau aonde eles estavam porque a sua gente estava doente. O dito Capitão Mor mandou logo uma caravela redonda e uma fusta com outros navios de remos, com o capitão D. Garcia Manriques e os levaram à ilha de Ternate, onde estavam a fazer a fortaleza. Ali os deixaram, sãos e doentes, e se asenhorearam da nau e da mercadoria e nos tolheram quatro meses. De Ternate os enviaram às ilhas de Banda que também são da sua Coroa, e daqui a Malaca, onde estiveram cinco meses, e dalí os levaram à Índia, para os apresentar ao governador da Índia, estiveram na cidade de Cochim, onde carregam a especiaria; dez meses que não nos davam de comer se não fossem alguns estrangeiros que nos socorriam morreríamos de fome e quando vimos que não nos queriam dar passagem, nós, mestre e piloto embarcámos ambos "escondidamente" com a ajuda de bons amigos estrangeiros, em uma nau das que vinham a Portugal, mas não pôde passar a Portugal porque foi preciso arribar a Moçambique para invernar. Estando em Moçambique, veio aqui uma nau das que vinham de Portugal e logo nos tomaram e nos entregaram ao capitão, presos em grilhões, que nos levassem a entregar na Índia, ao Governador. [...] e ficando desamparados sem sopa nem dinheiro e sem amigos, suplicavam ao Rei, porquanto foram presos estando ao seu serviço, lhes quisesse fazer a mercê de demandar ao rei de Portugal, para que pudessem socorrer as suas mulheres e filhas que tinham para casar, e se pudesse ser, que viessem com as primeiras naus; e que não fosse mais tarde. Que faziam saber ao Rei e Imperador que ele tinha lá "três verjeles" dos melhores que há no mundo, a saber, Maluco pelo cravo e banda, pela noz moscada e massa, e Timor pelo sândalo, com muitas outras ilhas ricas de oro e pérolas [...] eu estive numa ilha que se chama "Narsara Sanguin [?]" e os portugueses se puseram a resgatar ouro a peso, por peso de umas contas que se chamam "margazidezas [?]" que valem muito pouco dinheiro em Espanha.
No final está escrito. "Los que quiedan siempre rogando a nuestro señor Jesu Cristo por la vida y estado de su cesara majestad. Bautista d' Aponsoro y Leon Pancado maestre e piloto de la nao que fue tomada em Maluco".
Outra forma do nome: Juan Bautista de Punzorol.
Outra forma do nome: Léon Pancado.